18 março 2011

NO BRASIL, NÃO PRECISA SER DEPUTADO PARA LEGISLAR!

Há tempos venho denunciando uma prática que tem se tornado costumeira por parte de alguns comandantes da PMMG, que querem aplicar a disciplina ao seu bel prazer. Não sei o que se passa na cabeça dessas pessoas ou se, realmente, passa alguma coisa.

Estou estarrecido ao me deparar com mais um documento, desta vez elaborado pelo Coronel Ricardo Calixto que, ao assumir o comando da 13ª RPM, entendeu ele ter o direito de usurpar a competência do deputado estadual e/ou federal. Trata-se de um memorando em que o mesmo proíbe policiais militares sob seu comando de Se postarem nas margem das rodovias, fardados, com a finalidade de “pegar caronas”. Mais adiante, o citado memorando recomenda a adoção de medidas disciplinares pertinentes, nos casos de descumprimento da presente recomendação.

Não foi por acaso que este deputado apoiou firmemente a exigência do bacharelado em direito para concurso no quadro de oficiais da PMMG. Se isto já ocorresse, pelo menos esse coronel, em tese, não poderia alegar desconhecimento de preceitos constitucionais que são intocáveis.

Esqueceram de dizer ao coronel que ele não tem competência para alterar a Constituição da República, na qual alguns dispositivos não podem ser alterados nem mesmo por emenda à constituição. Dentre eles:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;”

Neste sentido, nos ensina o grande doutrinador do direito administrativo, Celso Antônio Bandeira de Melo, em sua obra:

“Nos termos do art. 5º, II, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Aí não se diz em virtude de decreto, regulamento, resolução, portaria ou quejandos. Diz-se em virtude de lei. Logo, a administração não poderá proibir ou impor comportamento algum a terceiro, salvo se estiver previamente embasada em determinada lei que lhe faculte proibir ou impor algo a quem quer que seja”. (MELLO, 2009, p. 102).

Como se vê, não se pode admitir que, a pretexto de cuidar da disciplina, o Coronel Ricardo Calixto pretenda, com um simples memorando, tipificar uma conduta e prescrever uma sanção. Para melhor entendimento do Coronel, citamos a lei estadual nº 14.184, de 2002, em seu artigo 4º:

“Art. 4º Somente a lei poderá condicionar o exercício de direito, impor dever, prever infração ou prescrever sanção.”

O que se vê, na prática, quando da edição de tais memorandos, é uma vontade de se punir os subordinados a qualquer custo, mesmo que, para isso, se rasgue a Constituição da República. A iniciativa do Coronel de baixar tal memorando é algo muito perigoso, pois imaginem quantos tenentes, capitães e majores sob seu comando passariam a comunicar disciplinarmente seus subordinados, visto que receberam ordem escrita do coronel para isso. Ou será que algum deles teria coragem de questioná-lo?

É fácil criar memorando e dizer para toda a tropa cumprir, afinal, o coronel tem motorista particular, uma viatura para gastar combustível do Estado, muitas vezes até fora de serviço, e buscar e levar em casa na hora que ele bem entender. Mas as praças que, por inúmeros motivos, precisam pegar uma carona, não podem, porque o Coronel entende que essa prática deve ser proibida.

Para finalizarmos o aspecto jurídico, devo ainda transcrever o artigo 11, do Código de Ética e Disciplina do Militares Estaduais, lei 14.310/02 :

“Art. 11 – Transgressão disciplinar é toda ofensa concreta aos princípios da ética e aos deveres inerentes às atividades das IMEs em sua manifestação elementar e simples, objetivamente especificada neste Código, distinguindo-se da infração penal, considerada violação dos bens juridicamente tutelados pelo Código Penal Militar ou comum”.

O Coronel deveria ter tido pelo menos o trabalho de consultar a lei 14310/02, pois, ao observar o artigo acima, iria perceber que, para uma conduta praticada por um militar ser passível de punição, ela deverá estar objetivamente especificada neste Código e não em um memorando. É isso que o Constituinte originário disse em 1988; é isso que o grande administrativista Celso Antônio Bandeira de Melo disse; é isso que as leis 14.184 e 14.310, ambas de 2002, disseram.

Esqueceram de dizer ao coronel que, ao baixar seu memorando, ele está violando flagrantemente a Constituição da República, conforme enunciado do artigo 37º, assim descrito:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”

O primeiro princípio constitucional a ser obedecido é a legalidade. Portanto, é muito clara a desobediência à lei por parte do Coronel ao editar o seu memorando. O próprio Código Penal Militar tipifica como crime a inobservância da lei, conforme prevê em seu artigo 324:

“Art. 324 - Deixar, no exercício de função, de observar lei, regulamento ou instrução, dando causa direta à prática de ato prejudicial à administração militar:
Pena - se o fato foi praticado por tolerância, detenção até seis meses; se por negligência, suspensão do exercício do posto, graduação, cargo ou função, de três meses a um ano”.

Temos que combater veementemente qualquer tentativa de burlar o Estado Democrático de Direito, pois, ao permitirmos, as consequências serão gravíssimas na vida das pessoas. O exemplo mais recente foi a demissão de nove policiais militares de Uberlândia, sob a alegação de violação de uma nota de instrução da corregedoria, que tem o mesmo status do memorando. Até hoje estamos lutando para reparar o abuso de autoridade cometido pelo ex-comandante da RPM de Uberlândia, Coronel Robson Nogueira.

Vou apresentar requerimento na Comissão de Constituição e Justiça da ALMG para realização de audiência pública, convidando o Coronel Ricardo Calixto a prestar esclarecimentos, bem como acionarei o Ministério Público.

Encerro minhas palavras deixando claro para todos os policiais e bombeiros militares de Minas Gerais que não permitirei violação de direitos em qualquer parte deste Estado. Tenho a exata compreensão da responsabilidade de ser guardião do direitos e garantias dos servidores da segurança pública em nosso Estado.

Deputado Sargento Rodrigues - Líder do PDT

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